Ontem conversei com dois economistas _Bráulio Borges e Francisco Pessoa_ que me deram vários argumentos contra a Copa no Brasil.
Saí do almoço pensando que o Brasil tem que bater os pés e não fazer o que a Fifa manda. Simplesmente abaixar a cabeça e seguir as ordens de uma entidade atolada num mar de lama, repleta de denúncias de corrupção e com a imagem arranhada em todos os cantos do mundo, não.
Economista-chefe da LCA, uma das principais consultorias econômicas do país, Bráulio Borges conta que esteve recentemente em Cape Town, na África do Sul, e que muitos defendem que o estádio construído para a Copa de 2010 seja demolido, pois ficou um elefante branco difícil de ser mantido.
Algo semelhante se deu com a estrutura montada para os Jogos de Pequim, em 2008, com várias arenas sem utilidade, assim como com a dos Jogos de Atenas, em 2004, que custa ao governo mais de 100 milhões de dólares por mês apenas para manutenção.
Resultado, no caso da Grécia, que estava à beira de quebrar e foi socorrida pelo FMI e pela Comunidade Europeia: o governo não vai mais manter a estrutura e deve entregá-la praticamente de graça para a iniciativa privada.
No Brasil, como bem apontaram Borges e Pessoa, a questão do legado não foi discutida. E o que se vê nos preparativos da Copa-2014 e dos Jogos-2016 é uma repetição do que tivemos no Pan-2007. O orçamento subiu de pouco mais de 400 milhões para 3,8 bilhões de reais e o legado foi praticamente nulo. Um dos maiores escândalos esportivos deste país e ninguém caiu com isso. Pelo contrário, o mesmo grupo é o que comanda os preparativos para os Jogos de 2016.
Segundo Borges e Pessoa, teremos uma série de elefantes brancos no Brasil, especialmente no Norte e Nordeste, num claro desperdício de dinheiro público.
No Sul e Sudeste possivelmente não, mas arenas como Fielzão, Maracanã e Mineirão serão construídas com dinheiro do contribuinte e não privado, ao contrário do que disse Ricardo Teixeira quando o Brasil garantiu o direito de sediar a Copa, em 2007.
Como praticamente nada foi feito até o início deste ano e as obras começaram a cerca de três anos do Mundial, os preços são mais altos, as empreiteiras ganham mais e os contribuintes só perdem com o novo cenário.
O metro de metrô construído fica mais caro porque tudo tem prazo para ficar pronto: 2014, no caso da Copa, e 2016, no caso da Olimpíada. E quem paga a conta, repito, somos nós.
Não se pensou nas arenas _e no seu uso pós-Copa_, não se fez um plano de mobilidade urbana (transportes, incluindo o setor aeroportuário), nem um para fomentar o turismo no Brasil.
Muita gente vem para ver os dois eventos? Sim. Mas e quantos deixam de vir por conta da confusão e dos preços que sobem quando eles acontecem? E não voltam mais nem recomendam uma visita ao país aos amigos por conta da desorganização e da falta de infraestrutura local?
Na África do Sul o turismo não cresceu depois da Copa, em julho de 2011 voltou a nível semelhante a julho de 2006 e a rede hoteleira de três das principais cidades do país chegou a ficar no primeiro semestre com capacidade ociosa de 76%. Sim, de 76%.
Na Alemanha em 2010 o turismo foi similar ao que era em 2005, ou seja, pouco mudou depois do Mundial de 2006.
Os taxistas, só para citar um exemplo, foram ou serão treinados para receber estrangeiros? Há algum plano para ensinar noções básicas de inglês a eles? Não, nada, nada, nada.
É certo o Rio ter gasto mais de 100 milhões de reais em 1999/2000 para preparar o Maracanã para o Mundial de Clubes, mais de 300 milhões em 2006/2007 para prepará-lo para o Pan e agora 1 bilhão de reais para a Copa de 2014? Sendo que o argumento para investir mais de 300 milhões no estádio em 2007, para o Pan, era que ficaria preparado para atender às exigências da Fifa. Não ficou e o dinheiro foi para o lixo.
E por que a Fifa exige tanto de países como África do Sul e Brasil, mudando seu “padrão” de 20 anos para cá? Pois na Copa de 1994, nos Estados Unidos, não foi preciso construir 12 estádios, as arenas foram adaptadas, muitas com estrutura provisória, para abrigar a Copa, mas… as empreiteiras não lucraram como na África do Sul ou no Brasil.
Por que não preparar o Pacaembu para receber jogos do Mundial em SP? Porque construir novos estádios dá dinheiro. Para as empreiteiras e… Gostaria de acreditar que para mais ninguém. Mas dá dinheiro. E o lucro da Fifa é cada vez maior. Cada vez maior.
Se dissermos um grande não à Fifa e fizermos a Copa do nosso jeito, não sob o comando de Teixeira e cia., duvido que ela a tire daqui. Mas vale correr o risco, pois do jeito que as coisas estão é prejuízo na certa. Como o próprio ministro do Esporte, Orlando Silva, confessou em relação ao Pan de 2007, o governo abriu as torneiras no fim para evitar um fiasco internacional.
Fiasco que já ocorre, pois o mundo todo sabe que estamos com problemas para organizar os dois eventos, o que arranha nossa imagem. Estamos mais atrasados do que a África do Sul a três anos do Mundial e do que a própria Rússia, que organizará a Copa de 2018. Ou seja, e o prejuízo para a “marca Brasil”? Ninguém fala disso?
Por que os organizadores não se mexeram em 2007 e deixaram tudo para a última hora? Por que o governo pouco fez depois do auge do caos aéreo, em 2007, deixando tudo para ser resolvido agora, às vésperas do Mundial? É legal gastarmos 50 bilhões de reais num trem-bala entre Campinas, São Paulo e Rio _e o preço fica cada vez mais caro a cada dia que nos aproximamos da Copa e dos Jogos_ quando a verba poderia ser usada em metrô e na melhoria de transporte público urbano em SP e Rio, cidades onde o trânsito é caótico e que serão “beneficiadas” pelo trem-bala?
O mais grave é que o Brasil soube oficialmente que seria a sede da Copa em 2007, mas pelo menos um ano e meio antes disso já tinha a informação de que o Mundial seria na América do Sul e que seríamos candidatos únicos ou no máximo teríamos um concorrente fraco, pois a Argentina não se candidataria. Julio Grondona, presidente da Associação de Futebol Argentino, cuja saída do cargo tem sido pedida nas ruas por estudantes e torcedores, é amigo íntimo de Ricardo Teixeira, presidente da CBF, cuja saída tem sido pedida nas redes sociais. Saída da presidência do Comitê Organizador Local e da própria CBF, onde se eterniza no poder desde 1989.
Enfim, chegou a hora de o Brasil peitar a Fifa e de o governo peitar Teixeira. Pois não adianta fazer faxina apenas no Ministério dos Transportes. A faxina tem que ser maior. O Pan de 2007 continua como exemplo a não ser seguido. Mas o que se vê é a repetição do Pan. Com orçamentos estratosféricos, obras de última hora, tudo feito às pressas, preocupação zero com o legado esportivo e social e o povo, sem escolas e um sistema de saúde decente, pagando as contas. Até quando?